Todos nós já escutamos alguém dizer que CrossFit lesiona e que devemos tomar cuidado. Sim, devemos mesmo. São movimentos complexos, muito técnicos, e que devem ser feitos com atenção. De fato, como já discutimos em outras ocasiões: má forma lesiona, coaches sem técnica/atenção ao aluno lesionam, má programação lesiona, ego lesiona. Nenhum esporte em si, incluindo o CrossFit, lesiona se praticado de forma correta e responsável.
Mas TODOS os esportes possuem suas problemáticas quando se trata de atletas de alto desempenho. Não é raro vermos atletas passando por cirurgias, ou complicações, ou diferentes tratamentos por causa da intensidade dos treinos e por que dão tudo que tem durante as provas. E isso não é diferente no CrossFit. Esse ano, contudo, um fato chamou muita atenção: pelo menos 15 atletas ficaram de fora dos regionais, se retiraram no meio ou foram prejudicados por causa de um único tipo de lesão. A lesão no músculo peitoral, que pode ou não ter afetado o tendão em alguns casos. Essa lesão acometeu veteranos de CF Games, novatos, caras grandes, caras menores….mas apenas homens! Dêem uma olhada na lista de atletas!!!
Atletas que sofreram antes da etapa regional:
- Alex Vigneault (nem chegou a competir);
- Sam Dancer, Ben Stoneberg, Nick Urankar (tiveram nas semanas que precederam os regionais);
- Khan Porter (no aquecimento).
Atletas que se lesionaram durante os regionais:
Kyle Cant, Corey Lunney, Christian Harris, Chase Smith, Alex Vigneault (antes), Nick Paladino, Christian Lucero, Henry Lopez, Nolan Gouveia, Adam Mansy, Dan Bailey
Alguns desses atletas competiram até o final, mas não foram bem. Outros desistiram após a prova. E uma cena marcante é a do Chase Smith caindo de dor durante o set de 15 reps de RING DIPS do evento 2. Sim, por incrível que pareça, não foi em nenhum movimento considerado absurdamente técnico ou em nenhum supino mega pesado (geralmente essa lesão se associa a esse movimento). Mas foi com RING DIPS.
O Evento 2 era o mais rápido de todos os WODs dos regionais. Era uma combinação de 21-15-9 de dumbbell snatch com 80/55 lbs e RING DIPS. Esse mesmo movimento que muitos de nós fazemos de forma displicente até.
Mas o que é essa lesão?
A lesão do músculo peitoral envolve a ruptura total ou parcial do músculo peitoral maior ou menor, podendo envolver também o tendão que liga o peitoral ao braço. Aparentemente, a maior parte dos atletas dos regionais teve uma lesão intermediária, uma ruptura parcial de parte das fibras musculares, o que limita o funcionamento pleno do músculo.
E como essa lesão é causada?
Essa lesão é provocada quando se é exercida uma força extrema sobre o músculo e/ou tendão da região maior que ele consegue aguentar. Exatamente por isso, essa lesão é mais comum em atletas de bodybuilding durante um supino muito pesado.
E o que tem a ver Ring Dips?
Ring Dips é um exercício exatamente que põe uma certa tensão nessa região. O estranho é que todos esses atletas devem fazer muitos e muitos ring dips e muscle ups durante o ano. Se há uma chance de ser excesso de treino? Há! Mas quem pode ter dado uma pista do que aconteceu foi o atleta Corey Lunney. Ele escreveu num thread do Reddit que é muito bom nesse tipo de movimento e que não tinha feito os WODs dos regionais em excesso. Ou seja, ele não acha que foi por que treinamos pouco o peitoral no CrossFit, nem por que foi excesso de repetição do movimento.
Mas ele queria 100 pontos. Ele queria ganhar esse evento 2. Então ele foi rápido. MUITO RÁPIDO. O mais rápido que ele já tinha ido. Ele também não recomenda que se vá tão rápido, que fique registrado. Mas era uma competição, uma corrida, e ele deu tudo que tinha. Talvez, se soubesse dos riscos, ele hoje não faria igual.
Mas o que causaria a lesão?
Ninguém está certo. Lucas Parker, famoso atleta do CF Games (que teve que se retirar após o evento 1 esse ano por causa de problemas médicos), acha que estaria relacionado a como as argolas estão penduradas. Não apenas elas estão penduradas em alturas maiores que a maioria dos atletas está acostumado a treinar em sua box, mas também a uma distância fixa, que deve ser maior que a normal para eles. Tudo isso traria uma instabilidade a mais. Some a isso a fadiga do bíceps e do ombro do evento 1 e o controle da argola, que deveria ser feito pelo úmero*, passaria a ser feito pelo peitoral, e ajudaria a causar as lesões.
Outros argumentam que para satisfazer o padrão de encostar os deltoides nas argolas, os homens estariam forçando um pouco mais o peitoral na hora de fazer isso acontecer. Isso por que os braços e antebraços dos homens são maiores que os das mulheres, o que os forçaria a se inclinarem para frente. E os homens são mais pesados, e apesar de terem mais músculos, a tensão continua sendo maior. Esse seria o motivo de acontecer com homens e não com mulheres. Mas de verdade…isso tudo é só especulação.
Isso teria como ser previsto?
Não sei. Eu creio que dessa vez não há muito como culpar o tio Dave. Mas acho que a partir de agora os atletas deverão tomar mais cuidado. E nós, meros mortais, temos que sempre…ao realizar qualquer movimento, executá-los concentrado, com a devida calma, cuidado e técnica. Especialmente para nós, mais importante que terminar em primeiro na turma, é fazer o movimento corretamente, prevenindo assim as lesões e poder treinar de forma saudável e por muitos anos ainda pela frente!
*O úmero é um osso longo e o maior do membro superior articulando com a escápula, o rádio e com a ulna através das articulações do ombro e do cotovelo